sexta-feira, 12 de setembro de 2008

A HISTÓRIA QUE JÁ VEIO ESCRITA.


Como conhecer jamais as insuspeitáveis possibilidades que o homem contém nessa pequena vida que lhe bate no peito? O universo é tão vasto. E assim como o macro é o micro. A beleza do sol não está apenas em seu fulgor ardente, mas na escolha pacífica da sua trajetória. Ele apenas se levanta, quando a terra ainda dorme, e segue impávido o seu caminho de luz sobre os feixes de trigo. Quando termina de abençoar aqui, começa lá. Foi-lhe devidamente providenciado que brilhasse, aquecesse e embebesse de vida a mínima semente que contém seu próprio mistério. E assim, um mistério ajuda ao outro, e ambos latejam em vida.

Também sei da história de uma rosa. Tão breve. Tão linda. Tão heroicamente nada, acostumados que estamos a pensar que tudo que apenas deleita os olhos é fútil. Um dia, toda rosa é uma rosa, mas no outro dia, toda rosa já era rosa. De carmim, suas pétalas passam a lembrar o fúscia, e depois o rosa, e depois o rosinha pálido que se transforma em anemia, e depois de grave doença anêmica, o que era - já não é - e tomba, nada sendo.

A rosa morre de morte tombada. Mesmo que o caule ainda lhe sustenha, ela desiste quando compreende – subitamente compreende- que a beleza inspirada por Deus não comove mais o coração dos homens. Que para isso ela veio.

Uma vez, de pena da rosa, guardei suas pétalas no meio de um livro. Ela protestou, pediu para ser devolvida à natureza e, nesse dia mesmo, logo pela tardinha, atendi ao seu protesto e a entreguei aos cuidados do vento.

O vento é primo distante da rosa. Cuidaria bem dela.

E o Padre Fábio de Melo? Que lindeza de amor profundo. Os olhos são a lâmpada do corpo, e Padre Fábio é de tanta luz e tanta água, que a mim parece um chafariz iluminado, abastecido do mais profundo manancial. Mas ele próprio é um remanso. Um remanso de grandes olhos negros, que me deixa de um sem fôlego comovido.

Quando assisto Pe Fábio, em seu programa semanal pela televisão, não o faço para ouvir o que de tão lindo ele fala, mas para ver o que de tão maravilhoso ele esconde. Padre Fábio é o simbolo que escolhi para ser o mistério de que vos falo hoje.

Houve um dia em que, em se sabendo mistério, Pe. Fábio desistiu de ser a folha que é levada pelo vento. E veio ser, para todo o Brasil, um pai precoce. Quando ele diz “minha filha” para qualquer mulher que tenha idade para ser-lhe mãe, já se sabe: esse já nasceu pai de uma humanidade desesperada. Um pai que representa o Pai. Mas que deixou esperando uma moça que queria ser mãe. Tão lindos seriam os filhos biológicos de Pe. Fábio, com a moça que queria ser mãe. E que não lhe nascerão nunca.

Todo esse rodeio, sabe-se logo é só um preâmbulo. Hoje quero fazer-lhe uma pergunta que há milênios me intriga: por que o grosso da humanidade pode gastar os melhores anos da vida na liberdade do vento e eu- essa que vos escreve- não posso?

Eis aí um mistério. Que experimento desde a mais tenra idade. Tenho a exata sensação de que não escolhi nada do que se me atribuem ter escolhido. Apenas recebi o que já se me havia configurado receber.

Outros recebem o que querem, o que pedem, o que elegem, o que preferem.Mas mesmo esses, esses que apenas vão, ainda guardam as possibilidades da semente, que todo homem contém, para ser plantado, nascido, crescido, morrido e comido.

Um certo dia, o vento que sopra aonde quer, faz do homem-folha um homem-semente, trazido por mão poderosa, que o faz receber, finalmente, o reino que lhe é familiar.

Familiar é gastar-se a cada dia, em mínimas porções de secreta nostalgia. Eu não consigo conceber um homem sem a nostalgia que acompanha o seu pequeno chamado de dura semente.

Um dia, o meu nome foi apenas anunciado. Não houve um tapete vermelho quando Deus falou: “vai Ana”. Também não haverá tapetes vermelhos quando Deus disser: “volte Ana!” E eu, eu que recebi a primeira lufada de vento bem no meio da cara, e acreditei que sim – que podia ir- tive bem cedo a experiência de uma correnteza direcionada: “é para cá,” disseram-me. E para cá, obediente, vim.

Podia ter ido tão mais longe. Possibilidades intrínsecas não me faltaram: logo cedo descobri que estar desassosegada era o postulado de uma liberdade que, em algum lugar, se me chamava. Eu era jovem - e era linda - e era perspicaz: meus olhos viam tudo e meu coração pedia mais. Então por que não fui?

Se eu soubesse a resposta, teria obtido a substância de que é feita a vida. E o modo de obter seria uma nova realidade de se ser.

Mas que sei eu?

Eu só sei pensar. E nesta manhã, quero pensar o que prefiro, o que gosto, o que faço bem: o imponderável da vida que se manifesta na alegria brevíssima de saber - apenas sabendo- que o sol, a rosa, o Pe Fábio, eu, você, e todos os homens feitos desse lindíssimo involuntário, um dia, receberemos um bilhete que nos dirá assim: “ vivemos um ao outro profundamente, e hoje Eu lhes ofereço a possibilidade de só viver em Mim."


Nem vou pensar duas vezes na possibilidade de me diluir inteira.




Um comentário:

Maria disse...

Oi Ana

Passando pra ver seus textos.
Boa Sorte com o diHITT e com o Blogblogs, me add lá.
Bjo